Tutorial sobre diarreia durante a NE: Um guia passo a passo
Autores: Pitta MR,
Campos FM, Monteiro AG, Cunha AGF, Porto JD, Gomes RR.
Instituto Brasiliense de Nutrologia (IBRANUTRO), Brasília,
Brasil.
JPEN J Parenter Enteral Nutr.
2019 Aug 11. [Epub ahead of print]
Neste artigo, após uma introdução com a definição e a
frequência com que a diarreia ocorre durante a NE, os autores fazem uma revisão
detalhada sobre os elementos que podem estar envolvidos na diarreia durante a
nutrição enteral.
A seguir trazemos um resumo dos tópicos abordados no artigo.
Definição: diarreia é
um aumento anormal na frequência das evacuações com diminuição na consistência
das fezes, caracterizados por mais de 3-5 evacuações/dia ou mais de 750 ml de
fezes eliminadas ao dia.
Frequência
da diarreia: ocorre em creca de 14 a 21% dos pacientes em UTI
Mecanismos causadores
de diarreia:
a.
Diarreia osmótica
b.
Diarreia secretória
c.
Diarreia exsudativa
d.
Diarreia por aumento motilidade
Revisão dos
elementos que podem estar envolvidos na diarreia.
1.
Nutrição
enteral:
A NE como
responsável pela diarreia é pouco frequente e só deve ser questionada após a
exclusão de todas as outras causa.
A NE contendo a proteína
completamente hidrolisada (NE elementar) geralmente é usada quando a diarreia é
devida à má-absorção.
A
literatura não recomenda o uso de NE
pobre em gorduras como forma de reduzir os episódios de diarreia durante a NE,
embora, em teoria, uma grande carga de lipídios em uma refeição pode funcionar
como um “gatilho” para a diarreia.
As
formulações de NE contendo TCM e óleo de peixe são geralmente mais bem
toleradas pela maior facilidade na absorção do TCM e pela influência que o óleo
de peixe exerce no processo inflamatório.
As dietas enterais com restrição de
lactose, frutose e/ou sacarose devem ser consideradas nos casos em que a
diarreia surge durante o uso de antibióticos.
A
osmolaridade da dieta, por si só não afetaria a frequência ou duração da
diarreia.
O uso de dietas com osmolaridade
alta em pacientes com hipoalbuminemia pode criar um cenário favorável ao
surgimento da diarreia.
2.
FODMAPS:
Embora
não haja consenso, alguns trabalhos apontam que as dietas com baixas
quantidades de FODMAPS estão associadas a menos episódios de diarreia.
3.
Fibras:
Na
ausência de instabilidade hemodinâmica, as dietas contendo 10-20 g de fibras
/dia (fibras solúveis ou um mix de fibras) são benéficas no que se refere à
prevenção e/ou melhora da diarreia.
4.
Probióticos:
O
uso dos probióticos no tratamento da diarreia é indicado nos pacientes com
diarreia causada pelo uso de antibióticos e na diarreia causada pelo
Clostridium difficile, desde que o paciente seja imuno-competente.
5.
Glutamina:
Os trabalhos atuais
indicam que, em função dos efeitos benéficos da glutamina na mucosa intestinal,
seu uso deve ser considerado no tratamento da diarreia que ocorra nos pacientes
que não estejam em ventilação mecânica, não apresentem falência de múltiplos
órgãos e não sejam portadores de neoplasia.
6.
Velocidade de administração da NE:
Velocidades excessivas
na administração da NE podem ser as responsáveis pela diarreia.
7.
Localização
da sonda.
O
estomago tolera dietas com osmolaridade alta e o jejuno só deve receber dietas
isotônicas ou hipotônicas.
8.
Contaminação
da dieta:
A
contaminação bacteriana da dieta enteral é uma causa rara de diarreia.
As tabelas a seguir resumem o que foi exposto no artigo sobre
as causas da diarreia, os medicamentos causadores de diarreia, as drogas
disponíveis para o manejo da diarreia, a classificação da gravidade da colite
pseudomembranosa e suas opções terapêuticas.
Tabela 1: Causas
de diarreia:
Mecanismo
|
Causas
|
Intolerância
|
Lactose, sorbitol, frutose
|
Infeccioso
|
Vírus, bactérias,
parasitas, outros
|
Insuf pancreática
|
Pancreatite crônica
|
Endócrino
|
Hiportireoidismo,
diabetes, Zolinger-Elisson, doença de Addison
|
Tumores
|
Feocromocitoma do tubo
digestivo
|
Má absorção
|
Intestino curto, doença inflamatória
intestinal crônica, doença celíaca, proliferação bacteriana em delgado
|
Má absorção de sais
biliares
|
Colestase,
pós-colecistectomia
|
Intoxicações
|
Intoxicação por metais
pesados
|
Fluxo sanguíneo
|
Má perfusão tecidual
|
Osmolaridade
|
Hipoalbuminemia
|
Tabela 2: Medicamentos
que podem causar diarreia
Grupo
|
Medicamento
|
Antibióticos
|
Vancomicina, ampicilina,
amoxicilina, cefalexina, cefexime, eritromicina, azitromicina, ciprofloxacina
|
Inibidores bomba
|
Omeprazol, esomeprazol,
lansoprazol, rabeprazol
|
Bloqueadores H2
|
Ranitidina, famotidina,
roxatidina
|
Procinéticos
|
Metoclopramida,
Domperidona
|
Colinérgicos
|
Donezepil, rivastigmina,
galantamina, betanecol,
|
Laxantes
|
Óleo de rícino, bisacodil,
senna, lactulose, polietileno glicol, sorbitol, sulfato de magnésio
|
Antidepressivos
|
Fluoxetina, sertralina,
escitalopram, citalopram, paroxetina
|
AINE
|
Diclofenaco, Ibuprofeno, Tenoxicam,
celocoxib
|
Beta bloqueadores
|
Propranolol, bisoprolol
|
Hipoglicemiantes
|
Metformina, acarbose, glipizida
|
Outros
|
Zolpidem, betahistina, colchicina,
digoxina, antiácidos contendo magnésio, suplementos de fósforo e de potássio,
medicamentos contendo manitol, renelato de estrôncio
|
Tabela 3: Medicamentos
para manejo da diarreia.
Medicamento
|
Dose
|
Loperamida
|
Dose inicial 4 mg seguidas
de 2 mg após cada evacuação. Dose máxima 16 mg
|
Sulfato de codeína
|
15 – 60 mg 4/4 horas. Dose
máxima 360 mg/dia
|
Rececadotril
|
100 mg de 6/6 horas. Dose
máxima 400 mg/dia
|
Colestiramina
|
1-6 envelopes/dia. Dose máxima 24 g/dia
|
Tabela 4: Gravidade da colite
pseudomembranosa e tratamento
Gravidade
|
Características
|
Tratamento
|
Não severa
|
Leucócitos ≤15000 +
creatinina ≤ 1,5
|
Vancomicina oral ou
Fidaxomicina* ou
Metronidazol
|
Severa
|
Leucócitos > 1500 +_creatinina
> 1,5
|
|
Fulminante
|
Hipotensão, choque, íleo ou
megacólon
|
Vancomicina VO ou retal + Metronidazol
IV
|
Recorrente
|
Recorrência dos sintomas
dentro de 8 semanas
|
Vancomicina oral ou
Fidaxomicina* ou
Metronidazol
Opção 2: Vancomicina +
Rifaximina** ou Fidaxomicina
Opção3:
Transplante fecal
|
OBS: * Fidaxomicina: Não comercializada no Brasil
** Rifaximina: Comercializada no Brasil com o nome de Xifaxan.